Primeira emissora de rádio do país e a mais antiga em operação, a Rádio MEC chega ao centenário em 2023. O resgate do protagonismo da emissora e a busca pela inovação tecnológica foram debatidos em audiência pública nesta quarta-feira (12) na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados.
Além da importância histórica da Rádio MEC na difusão da cultura e educação no país, deputados, especialistas e representantes da direção e dos empregados da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) relembraram o processo de desmonte enfrentado pela emissora nos últimos quatro anos, com ameaças de desligamento, de demissão de funcionários, tentativas de mudanças na programação e redução da potência.
A diretora de Conteúdo e Programação da EBC, Antonia Pellegrino, destacou que a reestruturação da rádio é uma das prioridades da nova gestão da empresa. A diretora informou que a EBC busca recursos para a digitalização do vasto acervo da emissora, passo considerado fundamental para uma futura solicitação do tombamento da rádio ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Ela ressaltou ainda o papel da rádio na defesa da democracia e no combate à desinformação.
“Chegar ao centenário na era digital é um convite a refletir sobre o futuro da MEC no contexto da democracia e da desinformação, como ampliar o alcance; conquistar nova audiência; retomar propostas fundadoras; como formação de público, difusão da música e da educação. É estratégico, diante das ameaças à democracia e à Constituição, que a MEC desempenhe com melhores condições sua vocação educativa e pública, incluindo reflexão crítica sobre acontecimentos e combate às fake news”, disse. A diretora representou na audiência pública o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta.
Um dos pontos levantados pelo professor da Universidade de São Paulo (USP), Laurindo Leal Filho, foi a ampliação do sinal da rádio para todo o país, considerado primordial para universalização da comunicação pública. “Se os cidadãos e cidadãs de um país pagam seus impostos para manter esse serviço, todos eles têm direito ao acesso. Este é um princípio básico e eu tenho convicção que este governo estará empenhado em trazer esse sinal para todos os lares”.
De acordo com o gerente-executivo das rádios EBC, Thiago Regotto, as formas de ampliação estão sendo estudadas dentro da empresa. “A sociedade deve ter acesso de forma igualitária ao rádio público. Para se ter ideia, a cidade do Rio de Janeiro é a que tem mais rádios públicas. No interior, há cidades que não têm acesso ao rádio público. Há capitais que tem uma ou nenhuma”, afirmou. Atualmente, a Rádio MEC opera no 800 AM na internet e aplicativos.
Já o professor adjunto e diretor do Núcleo de Rádio e TV da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Marcelo Kischinhevsky, trouxe a necessidade de se pensar a convergência da Rádio MEC com as mídias digitais para levar conteúdo de qualidade ao público jovem.
“A Rádio MEC chega ao seu centenário, mas continua mirando no futuro, oferecendo uma programação para adultos e os ouvintes do amanhã, com programas infantis de enorme qualidade. Temos a oportunidade única de retomar o investimento na radiodifusão pública e educativa pensando na formação de cidadãos, sem espaço para o extremismo, desinformação e negacionismo”.
Autora do pedido da audiência pública, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ) ressaltou que a comunicação pública tornou-se urgente na situação atual do país e para divulgação de informação aos brasileiros. “Temos que trazer a cultura da paz e a comunicação fará isso. A comunicação vai levar a verdade do povo para o povo. É essencial que a Rádio MEC, que a EBC tenha recursos”, disse.
A representante do Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio de Janeiro, Carolina Barreto, defendeu a recriação do Conselho Curador da EBC, com a participação de diversos segmentos da sociedade. “Queremos um Conselho Curador da sociedade civil porque não existe comunicação pública sem conselho. Isso faz parte das melhores práticas em todo o mundo”. O colegiado foi extinto em 2016, no governo de Michel Temer, e até o momento não foi restaurado.
Os participantes prestaram uma homenagem à professora da UFRJ e radialista aposentada pela Rádio MEC, Helena Theodoro. Funcionários da EBC na sucursal do Rio de Janeiro leram uma carta e fizeram uma apresentação artística de São Paulo.
Aos 15 anos, Helena iniciou a carreira como radialista na rádio. Em mais de três décadas, foi redatora, produtora e criou programas históricos, como o projeto Minerva (educação a distância), “Samba na Palma da Mão” e “Origens”, sobre cultura e história afro-brasileira.
Nos anos na MEC, Helena Theodoro contou como aprendeu a escrever peças de teatro, apreciar música clássica, popular brasileira e indígena, além da convivência com renomadas artistas do país, entre eles Fernanda Montenegro e Nicette Bruno.
Para a Helena, o rádio é a melhor forma de ouvir um povo. “Quando se pensa em reconstrução de cultura, devemos pensar na escuta. A escuta é fundamental. Nós tivemos um país que nunca deu escuta ao seu povo, nem à comunidade negra, nem à comunidade indígena, nem às classes mais pobres. A Rádio MEC sempre teve essa escuta”, contou.
A partir do dia 20 de abril, data de fundação da rádio, a EBC inicia os eventos comemorativos ao centenário. A programação prevê a volta de conteúdos e programas históricos da MEC e apresentação de orquestra sinfônica.