Depois de duas tentativas frustradas de oferta do edifício histórico ao mercado por meio de leilões, o primeiro arranha-céu em concreto armado do país foi anunciado na modalidade venda direta com 25% de desconto, pelo valor de R$ 28,9 milhões.
Diferentemente das etapas anteriores, em que a maior oferta concretizava o negócio, a venda direta permite a compra pelo primeiro interessado a apresentar uma proposta válida. Essa modalidade foi regulamentada pela Portaria nº 5.343/2022, editada em junho.
Com a fachada voltada para a Baía de Guanabara, a Praça Mauá e a Ponte Rio-Niterói, o Edifício A Noite ocupa um endereço que tem se valorizado com a reforma da zona portuária do Rio de Janeiro. O prédio fica no ponto em que o Boulevard Olímpico encontra a Avenida Rio Branco, e também tem como vizinhos o Museu de Arte do Rio e o Museu do Amanhã.
A posição estratégica faz com que a prefeitura do Rio tenha interesse na restauração do prédio e planeje, inclusive, comprá-lo caso a iniciativa privada não adquira o edifício por meio da venda direta.
O presidente da Companhia Carioca de Investimentos e Participações (Ccpar) da prefeitura, Gustavo Guerrante, disse que o ideal, do ponto de vista da gestão municipal, é que o governo federal consiga concluir a venda.
"Nossa preocupação é que isso se alongue muito. O processo de venda já vem se estendendo há bastante tempo. A gente fez um trabalho de revitalizar a área, e aquele prédio ficou sem ocupação", afirmou ele. "É um prédio vazio, de frente para a Praça Mauá, um prédio cujo potencial é fantástico. A gente está falando provavelmente da melhor localização daquela região como um todo", acrescentou.
Diante disso, a prefeitura acredita que, caso a venda direta da SPU para a iniciativa privada fracasse, o município possa conseguir comprar o A Noite e elaborar um modelo de venda para a iniciativa privada que reduza o risco para os investidores. Guerrante explicou que esse plano ainda não está pronto, mas uma das opções poderia ser parcelar o valor da compra e atrelar o pagamento à obtenção das licenças junto a órgãos como o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que precisará acompanhar o processo porque o prédio é tombado.
"O custo [de restauro] é alto, porque é um prédio muito grande. Estamos falando de mais de 23 mil metros de área construída, de um prédio da década de 1920, e com restrições. Tudo isso aumenta o custo. Quando você tem um custo de aquisição reduzido, essa conta fica bastante diferente", argumentou.
O presidente da Ccpar vê no edifício histórico um grande potencial residencial e misto, e compara o prédio ao Hotel Glória e ao Edifício Hilton Santos, ambos prédios históricos que passaram por retrofit [técnica de revitalização de construções antigas] para se tornar residenciais. Apesar do custo elevado, Guerrante defende que a iniciativa é sustentável por aproveitar o material já usado para erguer os edifícios e se beneficia de uma localização nobre que já não está mais disponível para construções novas.
"Aquele prédio está ali cravado. Não tem mais terra ali na área para ter aquele visual com aquelas características", enfatizou.
O Edifício A Noite foi construído na década de 1920, e era o maior edifício da América do Sul na época de sua inauguração, em 1929. O título A Noite é uma referência ao jornal homônimo sediado no local. O imóvel também abrigou a Rádio Nacional, da EBC, e o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi), além de consulados.
Atualmente, o prédio está sem uso e custa mais de R$ 1 milhão por ano à União com manutenção de elevadores, segurança, brigadistas e taxas de concessionárias.
O edifício foi projetado pelo arquiteto Joseph Gire, o mesmo que desenhou o projeto do Hotel Copacabana Palace e do Hotel Glória. Tornou-se sede da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, depois da criação, em 1936, da emissora, que passou a ocupar quatro andares alguns anos depois de sua inauguração.
Por seus corredores e elevadores circularam os principais nomes da cultura brasileira, na época em que a Rádio Nacional era um dos principais veículos de comunicação do país na fase de ouro do rádio, entre as décadas de 1940 e 1950.
O prédio passou a ser propriedade da União em 1940, devido a dívidas de sua proprietária, a Companhia Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande.
Em 2013, A Noite foi tombado com a inscrição em dois Livros do Tombo, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan): Belas Artes, por suas características arquitetônicas e inovações artísticas, e Histórico, pela centralidade que exerceu na história do rádio e da cultura brasileira. Trata-se de um símbolo da paisagem da zona portuária do Rio de Janeiro.
Além de ser tombado a nível federal, o monumento também é protegido a nível municipal pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH). Por conta dos tombamentos, o futuro proprietário será responsável por promover obras de conservação e restauro, bem como zelar pela manutenção do monumento.