Ninguém gostaria de estar na situação na qual todo o mundo se encontra hoje, após a crise do coronavírus. As pessoas estão premidas entre dois medos, de uma aceleração no ritmo das contaminações que leve a um cenário de terror como da Espanha ou Itália, por um lado, e de uma crise econômica sem precedentes, que lhes empurre ao desemprego e à carestia em massa, por outro. E o pior: uma hipótese não exclui necessariamente a outra. O que fazer numa hora dessas, em que muitos estão presos em casa, esperando notícias, talvez buscando equilíbrio entre a ansiedade e o desânimo? Só há uma resposta possível para isso: fazer com que, de alguma maneira, essa reclusão forçada seja útil. E não existe maneira melhor de fazer isso do que tentar desacelerar um pouco, e refletir. Quase nunca há tempo no dia a dia, nas coisas urgentes da vida que exigem todo o empenho, sempre adiando-se aquilo que é importante em razão daquilo que não pode esperar. Mas, justamente num momento de crise, durante o qual -- em situações normais -- muitos se sentiriam compelidos a sair tomando atitudes, há a oportunidade dessa vez de fazer algo diferente, usar um pouco desse tempo para pensar.
As preocupações justificáveis com o bem-estar próprio e da família, com a saúde das pessoas queridas, com a situação financeira, ganharam um componente novo e importante, que embaralha o jogo e pode fazer com que indivíduos sempre muito resolutos sintam-se impotentes diante de um fenômeno em escala global. Justamente essa escala deve merecer atenção agora. Quando as pessoas percebem que não estão isolados, que os acontecimentos em quaisquer lugares do mundo, e com quaisquer grupos de pessoas, podem muito bem afetá-las, essa só pode ser uma conclusão que ajuda a todos, à sociedade em geral, a passar para um outro patamar de civilização. Importa, de maneira concreta, que o vizinho próximo, do apartamento ao lado, não esteja contaminado. E, de maneira igualmente decisiva, que a Ásia, a Europa, a África tenham sucesso no combate à doença, porque do contrário ela pode retornar à porta de todos.
Neste momento, à procura de respostas, é preciso lidar com os conceitos de "pesquisa", "políticas públicas", "sistemas de saúde", "relações internacionais". Aquilo que era distante demais, genérico demais, abstrato demais, ganha atenção e densidade. Então, pode-se perceber como se faz ciência, e como ela importa de maneira muito efetiva para o bem-estar da população; e ela não se faz às pressas. Anos a fio, com financiamentos que não se sabe se darão resultados práticos, tomando decisões arriscadas, que ninguém sabe ao certo se serão de fato efetivas, com a penosa junção de saberes em áreas de especialização que lidam com o mundo físico, com as formas de vida e com as organizações sociais: é disso que se faz a boa ciência, a única que pode dar respostas neste momento.
Portanto, que a sociedade possa, ao menos, refletir, e emergir dessa situação o mais breve possível com a revalorização do papel da pesquisa científica no Brasil, com todos os custos e incertezas que ela envolve. Mas também com uma visão renovada do que significa viver juntos nesse pequeno e belo planeta.