Diferentemente do que se podia esperar em um momento de crise mundial, a pandemia manteve a inadimplência sob controle e em níveis historicamente baixos. Segundo dados do Banco Central, somente 3,1% de todo o saldo de crédito destinado a pessoas jurídicas apresenta atraso superior a 90 dias. Para além disso, de acordo com o setor de birôs de crédito, em agosto de 2020, o número de consumidores negativados caiu 1,5% na comparação com o mesmo mês do ano anterior.
O panorama positivo pode ser creditado às medidas de renegociação de dívidas, encorajadas no início da pandemia pelas empresas de proteção ao crédito, ao pagamento do auxílio emergencial, bem como às linhas de crédito e de auxílio criadas pelo governo.
No entanto, o mercado já se prepara para o que pode ocorrer no pós-crise. Internacionalmente, o cenário posterior a um grande trauma também se mostrou com potencial para a elevação da inadimplência. Respeitável executivo do setor de análise de crédito, Prasanna Dhore recentemente buscou na experiência de uma catástrofe natural um paralelo com a situação da pandemia. Ele observou que, em 2017, após a passagem do furacão Harvey, nos Estados Unidos, a taxa de inadimplência foi menor do que se esperava no cenário base, o que se explica pelos empréstimos liberados em razão da catástrofe. Mas, um ano depois do ocorrido, a taxa de inadimplência alcançou um patamar maior do que o esperado.
Dessa maneira, a possibilidade de um repique da inadimplência merece especial atenção. No relatório World Economic Outlook, o Fundo Monetário Internacional alerta para o crescente risco de falências entre pequenas e médias empresas – um grupo que, além de conter setores mais expostos às medidas de distanciamento, tem acesso limitado ao crédito. Segundo o órgão, medidas governamentais adicionais terão de ser tomadas para preservar empresas e empregos.
"A pandemia dura bem mais que a passagem de um furacão. Caminhamos para completar um ano desde que as primeiras notícias sobre o vírus surgiram, ainda sem muita clareza sobre quando a vida voltará ao normal, visto que ainda estão em desenvolvimento remédios e vacinas para combater o vírus. O que sabemos é que a velocidade da retomada será distinta por setor econômico e por país", aponta Elias Sfeir, presidente da Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC). "Além disso, o endividamento dos governos pode limitar a capacidade de resposta a uma eventual segunda onda, como já ocorre em algumas partes da Europa."
Sfeir destaca a importância da nota divulgada pela Secretaria de Política Econômica, que entende ser necessário reforçar o canal do crédito em 2021. "Com as contas públicas no limite, a ideia é melhorar a eficiência das garantias e reduzir entraves burocráticos e sempre utilizar a análise de crédito", completa o executivo.